Cultura e amor, por Bruno Peron
Decerto, temas culturais fornecem combustível para meu pensamento. Não é somente porque minha formação pós-graduada nessa área de estudos (referente a cultura) o exige e o motiva senão pelas combinações provocadoras que faço entre cultura e algo mais. No entanto, e sem pretensão aqui de ensaiar um ponto de vista instrumental (cultura como meio para), fico um pouco intrigado quando cotejo a abrangência de cultura com a de amor.
Primeiramente, é preciso esclarecer que as noções de cultura comummente aceitas têm seu conteúdo espiritualista (ideias, imaginações, preconceitos, valores) em destaque, mas elas não prescindem das características materialistas (costumes, formas de vida, estética, gosto) de cultura.
Logo, qualquer expressão cultural carrega uma marca de nascença, um selo de origem, algo que atesta que ela é feita em tal lugar para tal indivíduo. Culturas reproduzem-se e transformam-se de acordo com o desenvolvimento material de um grupo, uma instituição, uma sociedade, um país. Quer dizer, elas refletem o que é e também mudam suas condições de existência.
Sendo assim, quero chegar ao ponto de que toda cultura é relativa e particular porque ela indica um conjunto de processos sociais que a geraram dentro de circunstâncias determinadas. Não demora muito para que tenhamos a impressão de que “valores universais” através de bens patrimoniais e de outros objetos e práticas simbólicos são disparates em cabeça francesa.
Assim, já propus noutras publicações que a diplomacia (pelo menos a brasileira) deve levar em conta essas variações culturais para que não seja trágica como a EUAna, belicosa como a Cool Britannica (onde seus cidadãos usam o “red poppy” no paletó em comiseração pelos soldados Cool Britannicos que morreram em combate), ou um valor universal como a La Francesa. Há que entender melhor os códigos que situam nações juntas para discutir temas de importância global, como paz e meio ambiente.
Apesar de que temas culturais merecem tal expansão, este texto faz uma comparação breve entre o relativismo de cultura e a universalidade de amor.
Desse modo, vejo-me incentivado a revelar algumas intuições sobre o alcance muito mais espiritualista e profundo de amor que o de cultura.
Amor é uma virtude preceituada em muitas religiões e que se revela, de pouco a pouco, em interações sinceras entre seres que se entendem antes de destruir-se. Amor é a anti-paixão ainda pouco compreendida e até desentendida entre quem a confunde com apetites carnais e materialistas, como o namoro ciumento, o sexo egoísta e o drama de telenovela.
O que mais me intriga nos fulgores de amor é a universalidade de sua prática e sua percepção, ao contrário do que acabo de argumentar sobre cultura.
Não importa em que língua se expresse, ou qual é o nível evolutivo de quem ama, ou que tão brevemente o amor se manifeste, o ato de amar resplandece numa autenticação consensual entre todos os que testemunham sua energia.
Por isso, a prestação de auxílio aos necessitados, a palavra amiga aos sofredores, o sorriso que aquece, e a renúncia do interesse próprio para melhorar o conforto de outrem envolvem os seres num sentimento universalmente benévolo, gratificante, tranquilizador e vivificante.
Agrego que o amor é inefável.
Não é à toa que o alfabeto chinês seja complicado para o leitor ocidental e a belicosidade EUAna seja pueril diante da sabedoria milenar tibetana. Esses exemplos merecem espaço enquanto faço uma comparação entre o relativo e o universal respectivamente nas expressões de cultura e amor.
Amor é uma virtude assaz difícil de entender e praticar.
É porque cultura é linguística, enquanto amor é anímico.
O brilho do amor virá para ficar assim que se o aprenda.
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O autor Bruno Peron é escritor e analista de Relações Internacionais, professor de idiomas (português e Inglês) e Voluntário de Organizações SEM Nadadeiras lucrativos.